[Eis um texto antigo que estava nos rascunhos até hoje, às vezes eu preciso tomar distância de um texto para poder publicá-lo.]

Em “O Jovem”, Annie Ernaux fala sobre seu relacionamento com um rapaz 30 anos mais jovem que ela. Minha história até hoje não teria nada em comum com essa, mas fiquei impressionada com o nível de identificação que tive com alguns trechos. A autora trata de temas universais para as mulheres, como o fato de sermos julgadas apenas por existir de uma forma ou de outra. Jovens demais, velhas demais, jovens tentando ser velhas, velhas querendo ser jovens e nunca somos apenas da nossa idade - aliás, que conceito cruel esse da "idade", não é?! Essa reflexão sobre a idade, entretanto, eu já estou cansada de fazer aqui. O que gostaria de falar mesmo sobre as possibilidades de se viver outras histórias. 

No início, ela diz que foi atrás de viver esse relacionamento para poder contar essa história e eu gostei bastante do pragmatismo e de uma visão basicamente a-romântica de se estar com outra pessoa. Não é algo que eu tenha pensado em fazer, mas sou sempre a favor de aprender sobre outras formas de ver coisas aparentemente tão consolidadas no nosso pensamento ocidental. Acho ousadas as pessoas que quebram regras que, na verdade, só são regras pois é assim como a sociedade entende certas coisas e poucos são capazes de oferecer alternativas. Obviamente, essas pessoas corajosas são vistas como excêntricas, loucas, ou qualquer adjetivo com essa mesma conotação de "eu gostaria de fazer isso, mas, como não posso/tenho coragem, vou criticar".

Talvez eu esteja arrodeando um pouco antes de chegar ao meu ponto (e estou com bastante sono e cansaço pós viagem de férias e dois vôos de madrugada de volta para casa) ou talvez me falte coragem para dizer que muitas vezes imaginei como seria se eu estivesse em relacionamentos com outras pessoas. Annie, ao tratar da liberdade feminina, procura viver as experiências ela mesma para poder relatá-las, e até analisá-las. Muitas outras mulheres - como eu - ficarão no campo da imaginação, da fantasia, daqueles pensamentos que geram culpa, pois, se estou num relacionamento monogâmico há anos, as regras morais da sociedade (e da religião) me impedem até de pensar nos meus "quase algos". É pecado, é errado, é desrespeitoso com a outra pessoa. Mas e quem está vigiando meus próprios pensamentos a não ser eu mesma?

Annie teve a coragem de se relacionar com homens diversos e dissecou esses relacionamentos em seus livros. A minha coragem talvez seja de pensar em possibilidades de relacionamentos com homens diversos e viver isso na minha mente, nos meus sonhos. E confessar isso aqui também é corajoso, pois tenho certeza de que muitas pessoas (principalmente as monogâmicas) em relações saudáveis e tranquilas já se pegaram pensando alguma vez na vida em "como seria se...". E está tudo bem algumas coisas ficarem apenas no campo do desejo. Até porque seria uma loucura se todo mundo pudesse satisfazer os próprios desejos o tempo todo.

Quando eu viajo para algum lugar ou passo na frente de uma casa interessante, sempre me pergunto como seria morar ali. Que rotinas teria, como seria a faxina, os barulhos, cheiros e deslocamentos que faria, entre tantas outras coisas que o pensamento pode alcançar em poucos segundos. Entende aonde quero chegar? Porém, eu posso estar me justificando demais e esse texto é apenas uma confissão de quem utiliza um blog como um diário, o lugar onde escrevemos nossos pensamentos secretos, que jamais deveriam ser lidos por ninguém justamente pelas sensações que podem causar ao suposto leitor (violador dos segredos alheios): tédio, choque, julgamentos, surpresa, tristeza, empatia... E você, o que sente ao ler o diário público das outras pessoas? Que pensamentos seus não poderiam ser publicados?

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